Presta Atenção no Procedimento...

...porque o basquete é duro e a bola de voleibol é mole.

sábado, setembro 24, 2005

Debruçando-se sobre as fontes [...]

-O mundo não me assusta, o mundo só me insulta.

Uma das coisas mais deliciosas em um curso como o de História é o olhar ficar atento a deslizes e, antes de tudo, buscar as fontes.
Há algum tempo venho pensando muito dessa forma; modo de, indicialmente, buscar em detalhes o imperceptível a leituras - não apenas de textos, é claro - mais apressadas.
Pois eis que veio-me à mente o caso de nosso querido João Paulo II. Foi, definitivamente, imortalizado como um ícone de justiça e humildade para a igreja católica. Mas, sinceramente, quantos de nós já teve a experiência de ler um de seus discursos e ir um pouco mais além do que a mera repetição do chavão socialmene aceito a seu respeito?
Fiquei curioso. Busquei. Não foi muito fácil, admito, mas digo que, antes de mais nada, senti-me satisfeito em tê-lo feito e erguer uma visão própria sobre o assunto.

Eis minhas impressões...

Topei com o principal discurso feito por Wojtyla por ocasião da admissão da culpa em relação ao antijudaísmo cristão. Suas primeiras palavras foram "caros amigos e irmãos, judeus e cristãos". É registrado, então, uma ovação inesperada irrompida na assistência. O Osservatore Romano registrou o fato como "quase impresvisível, mas longa e calorosa". A aceitação dos judeus como irmãos dos católicos, claro que fato observável pelo desdobramento histórico de ambas religiões, parece ser reiteradamente enfatizado ao longo do texto.
Mas algo me chamou a atenção; a certa altura do discurso, Wojtyla afirma: "vocês são nossos irmãos prediletos e, de certo modo, poderíamos dizer, nossos irmãos mais velhos".
Tal frase, prenunciando a inauguração de novas relações entre tais religiões, resumiria todo o contexto do discurso. No entanto, algo me incomodou; lembrei-me imediatamente de uma certa passagem bíblica que ecoava em tal reconhecimento dos judeus enquanto "irmãos mais velhos". Logo recorri ao texto original e eis que localizei o trecho que me lembrara tal colocação do então Papa: era a epístola de São Paulo aos romanos (9:12).
No início de Romanos 9, Paulo recorda a profecia que o Senhor fizera a Rebeca, grávida de dois gêmeos (Gênesis 25:23): "O mais velho será servo do mais moço". E foi o que aconteceu: Jacó, o mais moço, comprara do mais velho, Esaú, a primogenitura por um prato de lentilhas. depois passara ardilosamente na frente de Esaú para obter a bênção do velho pai cego, Isaac. Paulo aplica a profecia à relação entre judeus e gentios convertidos ao cristianismo: "O mais velho será servo do mais moço", ou seja, os judeus (Esaú) serão servos dos gentios convertidos (Jacó). Paulo logo em seguida acrescenta outra citação, as palavras que o profeta Malaquias atribuiu ao Senhor: "Amei Jacó e odiei Esaú". Durante dois milênios, o ódio cristão aos judeus, considerados representantes da letra contra o espírito e da carne contra o espírito, encontrou legitimação nesse fragmento do judeu converso Paulo. Se há um texto fundador do antijudaísmo cristão, é esse.
Tudo isso me atraiu muito o interesse; eis a hora de levantar certas hipóteses de trabalho.
1. Mera coincidência; no meu ponto de vista, a possibilidade mais inaceitável. A presença de tal fragmento no discurso de Wojtyla não consistiria uma intertextualidade, mas sim uma posição inocente em todos os sentidos. Mais à frente creio que ficará claro porque não aceito com tanta facilidade tal opção.
2. Subtexto intencional; creio que tal alternativa também não seria facilmente mantida: tais relações diplomáticas estabelecidas pelo papa não iriam reconhecer abertamente tal hierarquização como forma de subentender um preconceito. Não existiria motivo claro para deixa em aberta tal possibilidade.
3. Laços fortes à ideologização dos textos sagrados; talvez essa seja a opção mais verossímil. Não seria, de forma alguma, espécie de artifício inconsciente - no sentido freudiano de tensões agressivas - externado pelo papa.
Creio que, diante de tal fragmento de análise, algumas ressalvas à obediência a certas bulas religiosas - como a bíblia - poderiam vir à tona. Preso à doutrina, baseada primordialmente em tais textos e em pronunciamentos ex-catedra do pontífice, Wojtyla teria, simplesmente, escorregado em suas próprias palavras e reafirmado certas visões sobre o judaísmo: introjetadas por uma série de mecanismos de controle oferecidos pela própria igreja a Wojtyla, seu discurso, buscando tornar inteligível o termo "judeus", automaticamente o dirigiria à passagem dos Romanos.
Em outras palavras, por tanto ser preso a visões de mundo pretensamente cristalizadas em um texto quase bimilenar, prende-se ao passado. Eis, em suma, a enunciação do grande desafio proposto à igreja católica: reformar-se sem, no entanto, perder-se no percurso desviando-se dos textos sagrados ou afastando-se das tradições.

Bem, era só um ponto de análise que me ocorreu; ficaria satisfeitíssimo se pudesse debater diretamente com vocês tais assuntos algum dia.

Mais do que nunca,

Os senhores tirem suas próprias conclusões.

quinta-feira, setembro 22, 2005

Primavera

Chegou a primavera.... e o que muda???
A primavera é uma estação bonita, florida e romantica..... continuo a pergunta o que muda????
Aos amantes a primavera traz a tona toda a sencibilidade do amos..... flores cada vez mais coloridas bonitas e diferentes surgem todos os dias... as mulheres ficam cada vez mais romanticas e até os homens sentem um ar diferente!!!!
Mas para os solitários assim como no clima a primavera traz pancadas de chuvas e solidão....
Esse cientista que vos fala nesse momento é um eterno apaixonado.... estar apaixonado é o que me faz viver e o que me motiva a voltar a respirar cada vez que a apineia ataca.... a paixão é um pássaro que vence um avião, é o que torna o céu azul em busca de torna-se um só..... quando estamos apaixonados nosso coração bate como bateria de escola de samba..... talvez a minha necessidade de estar constantemente apaixonado venha como uma fuga para a lembraça, de que já tive com a mulher da minha vida.... mas infelizmente eu não a fazia feliz..... os pensamentos e lembranças podem ser crueis.... aidna mais quando se sabe que poderia se ter feito muito mais por essa pessoa.... mas por pura falta de copetencia hoje o maximo que posso fazer por ela é oferecer minha amizade...... com dor sim, mas sem rancor..... e com uma grande lição que tento aprender.... "Amar só vale a pena quando o amor é vivido a dois"..... talvez o que eu precise é ficar quieto no meu canto aprendendo a quebrar a cara todo dia, e vivendo de pseudo amores.... me apaixonando todos os dias por pessoas que não vão me fazer feliz, mas que vão me dar um falso sentimento de que sou completo.... isso até a pessoa perceber que não a faço feliz, me tirar de sua vida e me substituir como se eu fosse um pé de meia sujo..... perdi a mulher da minha vida e tudo que eu queria agora era apenas mais uma chance .... chance que talvez eu nem mereça..... a unica coisa que posso fazer é passar o amor e o carinho que tenho acumulado aos meus amigos, e peço a vocês não me troquem também como seu eu fosse um pé de meia....
Sem mais melancolias....
Abraços...
Lipidío....

quinta-feira, setembro 08, 2005

Galináceos de todo o mundo, uni-vos

-Bill Clinton era mais pacífico, só fodia a estagiária.

Véspera de feriado; algumas cervejas, Seletas, bons amigos, verdade-ou-consequência, debates acalorados. Poderia ser mais?
Pois digo que não.
Sentia falta desses encontros, desses ânimos exaltados. Se bem que nosso casal 20 deveria centrar-se mais: tenho para mim que tais discussões não devem visar o convencimento, mas a mera disputa retórica. E nada mais.
Acalmem-se, crianças, crenças são algo muito sério para uma mesa de bar. Toda e qualquer tentativa de convencimento cheira-me a messianismo; e em relação a isso preciso falar mais alguma coisa?

Não queremos transformar nosso círculo de amizades em uma cruzada ou qualquer outra espécie de guerra santa, não é mesmo?

Pois em verdade vos digo que fiquei um belo tempo depois da partida de nossos queridíssimos Bella e Matheus conversando com o Lipídio; e nenhuma discussão sequer.

Creio que tenha faltado nosso saudoso Squit para que a discussão não perdesse a estribeira.

Bem, mas falemos amenidades.

7 mil galinhas vivas caem de caminhão no RS
Milhares de galinhas executaram um audacioso plano de fuga em massa em Porto Alegre. Quando o caminhão que as levava humilhantemente presas em caixas fez uma curva fechada, aproveitaram a força gravitacional da manobra para desestabilizar o veículo e derrubar quase toda carga no chão.
O plano é cheio de simbologia: foi executado exatamente entre a Santa Casa de Misericórdia e um prédio da UFRGS (esse antro de comunistas libertários) e estima-se que algumas delas tenham conseguido fugir para a Redenção! Mas uma porta voz da galinhas informou que "infelizmente algumas companheiras perderam a vida tentado ganhar a liberdade".
As que conseguiram executar o plano com sucesso quase total, saindo de suas caixas mas permanecendo no local, improvisaram um movimento pró-liberdade refugiando-se estrategicamente debaixo do caminhão, onde formaram um grande foco de resistência e assim esperam resistir bravamente a qualquer tentativa de recaptura.

Definitivamente, vivemos em um Mundo Cão; ou galinha, como quiserem.

Os senhores tirem suas próprias conclusões.

sábado, setembro 03, 2005

...e mais um bacharel.

-Se vou virar mulher na cadeia, que seja uma ruiva.

É, parece que a nova safra de graduados anda a todo o vapor.
Para quem não pode ir ou não conseguiu chegar a tempo, mando abaixo o discurso da colação; e, para aqueles que não entenderam direito por causa do meu nervosismo, é claro.

Pela história
A todos presentes, boa noite.
Nós, graduados no curso de História do primeiro semestre de 2005, somos órfãos de nossa própria época. Diante de prazeres presentes, recompensas circunstanciais, nosso olhar cravado na história parece insistir no passado; como o “Ângelus Novus” de Paul Klee, fixamos o olhar em algo que nos é roubado pela insistência de nossas próprias asas em arrastar-nos presente acima.
Graduamo-nos em um ofício síssifico, árdua tarefa de, visando o topo, saber que nossa própria jornada interdita-nos a possibilidade de um fim. Sentimo-nos punidos por tentar enganar Thanatos e lembrar aquilo que todos ousam esquecer. Lembramos/construímos um passado ido, memória de memórias desbotadas no amarelado de arquivos, no ofegar de relatos, em vestígios conotadores de um quebra-cabeça irrecuperável.
Frente a um hedonismo alicerçado sobre o par prazer/dor, insistimos em um anteontem reiteradamente esquecido.
Nossa disciplina parece ser, antes de tudo, uma lição cômica.
Aristóteles acreditava no riso como possibilidade de contestação, indício de algum equívoco; pois vemos que verdades fazem sentido, sobretudo, para seu tempo. Afirmações inaceitáveis – posto que pequenas loucuras – carregam em si algo semelhante a anacronismos: qualquer certeza absoluta pode, então, soar historicamente improvável.
Pois é exatamente nesse incerto correr de tinta que nossas penas erguem monumentos inspirando um transe quase pitonista. Entretanto, de nosso oráculo concentramo-nos em uma espécie de futurologia retrospectiva, profecias passadas; mas, ainda assim, pouco temos de êxtase.
Não podemos, horizontalizados, recostarmo-nos em um divã imaginando-nos como formados em uma contemporaneidade atemporal. Temos algo de pintura; diferentemente da escultura, tal espécie de arte funcionaria, segundo Leonardo da Vinci, “per via de colocare”. Em outras palavras, transformar a tela harmoniosamente vazia em obra belissimamente suja. Traçamos, portanto, efemérides sobre nossos próprios quadros: buscamos compreender cada pincelada, entender tons sobrepostos e lembrar contornos borrados pelo tempo. Mostramos, enfim, que tal obra-prima não é concebida apenas no aqui e no agora, mas sim gestada ao longo de séculos num insistente gotejar de estalactites.
Somos, entretanto, o próprio enredo que não transborda nem uma fração de milímetro além do tamanho de nossa própria história.
Fomos pintados ao longo de quatro, cinco, seis anos como historiadores. Sobre nossa tela erguem-se monumentos de tempos imemoriais trazidos por afetos, aulas, inimizades, bibliografias; em evoluções sincopadas pelo ritmo de tantos semestres graduamo-nos esta noite.
Permitindo-nos o capelo, ofertando-nos nossos diplomas, a autoridade evocada por nossos professores e demais membros da mesa institucionaliza-nos como bacharéis e licenciados.
Mas sim, estas poucas linhas têm certo tom de prece: que tal ritual não se assemelhe a certo baile da Ilha Fiscal, preconizando o fim de um regime, mas que seja encarado como vitrine, amostra daquilo que levaremos, enquanto nossa história, para fora desses portões que por tanto tempo nos encerraram como graduandos.
Das trincheiras da primeira guerra mundial, um francês escreve um relato em seu diário: “A alguns passos de nós, no fundo da trincheira, jaz um corpo. É de um suboficial: está enterrado pela metade; vê-se apenas a cabeça, um ombro e um braço, com a mão contraída qual gancho. Ele está ali desde o dia anterior, o braço se enrijeceu e ficou especado, e todos que andam pela vala se engatam e tropeçam na mão e no corpo. Seria preciso cortar o braço ou retirar o corpo. Ninguém tem coragem.”
Alguns séculos antes, em 1560, o oficial de uma embarcação que se dirigia à colônia lusitana na América relata o que acontecera a um grumete: “aos dezenove de julho, que foi um sábado sobre a noite, fazendo com que o vento muito, por serem de través, estando o gajeiro da gávea em pé em cima para descer, bem descuidado, deu a nau um balanço grande, com que meteu, e lançou o pobre grumete por cima da gávea, que veio pelo cair ao mar, dando com as pernas e partes do corpo em os pés de um homem que a bordo estava pegado, o qual consigo houvera de levar ao mar, deixando-o aleijado da grande pancada que lhe deu um deles, e desfazendo a cabeça em pedaços, com os miolos fora dela, nas vergas, que todas ficaram tinta do seu sangue”.
Em 1880, na cidade do Rio de Janeiro, Lourenço Soares, sapateiro, fora acusado de assassinar Guilhermina, mulher com a qual viva há seis anos. A causa da briga foi a decisão de Guilhermina em alugar um quarto e se separar de seu amásio. Há testemunhas que descrevem-na como mulher muito trabalhadora, sustentando o casal.
Em 1876, em Pernambuco, algumas crianças brincavam em frente à matriz da igreja cantando a seguinte estrofe:
“Atirei um limão verde
De pesado foi ao fundo
Os peixinhos responderam
Viva Dom Pedro Segundo”
Em 1765, Alliot, francês exilado de sua pátria por crimes cometidos, remete uma carta a seu pai: “Dignai-vos pelo menos a abrandar minha sorte; já não fui suficientemente punido pela dor em minha perna, por estar separado de minha mulher e de meu filho, por me encontrar a duas mil léguas da pátria, mais miserável que os negros que habitam esta terra?”
Diante de tantas pequenas histórias fomos crivados historiadores. Lembranças de amores idos, de ódios esquecidos pelo tempo, de um dia-a-dia por vezes nada casual sempre imerso no mesmo cotidiano. Personagens que não conheceríamos não fossem os vestígios que nos são permitidos pelo tempo. Eis que, lusitanamente, sentimos saudade. Entretanto, configura-se como sentimento inusitado, um saudosismo referente a tudo aquilo que não vivemos.
Não posso desejar nada além de que não nos esqueçamos de tantas histórias. Alguns desta turma lecionarão, outros prestarão concursos, alguns se aventurarão em pesquisas. Mas, ainda que nossas penas não corram mais novas histórias, desejo que todos esses anônimos transbordem de nós em cada gesto, olhar, palavra. Enganemos Thanatos e lembremos daquilo que é esquecido.
Boa noite.


E tenho dito!

Os senhores tirem suas próprias conclusões.